Um dos episódios mais curiosos com anúncios políticos passou-se no ano de 1986. Ronald Reagan estava na presidência, e o défice era já um tema central da politica americana, e uma das bandeiras do presidente. A corporação WR Grace , que mais tarde se veria envolvida em vários processos de contaminação de solos, rios e populações (dando origem a este filme com John Travolta), fazia parte de uma task-force do presidente para lidar com o problema da dívida federal e apresentar soluções para o mítico "small-government", que ainda hoje é parte central do imaginário Republicano.
Um dos passos que deram foi comissionar um anúncio ao famoso realizador Ridley Scott, a passar imediatamente após o discurso do Estado da União desse ano. Com valores de produção inéditos para a altura, o resultado é um filme futurista, de nome "The Deficit trials", absolutamente fabuloso:
Mas a América nessa década era um sítio bastante diferente, e para grande surpresa de WR Grace, as principais televisões recusaram-se a passá-lo, por ser considerado "demasiado controverso". Apesar de ter custado uma pequena fortuna, quase ninguém o viu, e o belo trabalho de Ridley Scott caiu rapidamente no esquecimento. A história, em reportagem da época, pode ser vista aqui.
Um dos casos destas eleições andou à volta de um anúncio do NRSC (National Republican Senatorial Committe) que atacava o candidato Democrata ao senado pela West Virginia, Joe Manchin (o tal que gosta de andar aos tiros). No anúncio em baixo, bastante normal pelos standards dos anúncios de ataque, três amigos discutem se será boa ideia mandar Joe para Washington, porque seria "um voto para Obama". Eles até gostam dele, veja-se, tem sido um bom governador, seria melhor não o estragar:
Tudo perfeitamente normal e genuíno, típica conversa de bar, excepto por um detalhe que se veio revelar escandaloso: os três amigos, longe de serem West Virginians, como o anúncio implica, eram na verdade actores contratados fora do estado, e o anúncio foi i.filmado em...Philadelphia. Lá se vai o "efeito genuíno". Pior, veio depois a saber-se que foram seleccionados através de um anúncio que dizia estarem à procura de um estilo "parolo":
We are going for a ‘Hicky’ Blue Collar look,” read the casting call for the ad, being aired by the National Republican Senatorial Committee. “These characters are from West Virginia so think coal miner/trucker looks.
Claro que o candidato democrata exigiu imediatamente um pedido de desculpas ao seu oponente Republicano, John Raese, que como é evidente não surgiu. E após a polémica ganhar alguma tracção na imprensa local, seguiu-se o merecido anúncio de ataque, bastante mais devastador:
John Raese caiu, em mês e meio, 11 pontos nas sondagens, estando agora a 6 do seu oponente. Não insultar os eleitores é sempre uma boa estratégia.
Christine o'Donnell, candidata republicana do Tea Party ao Senado pelo Delaware, já prometia bastante quando ganhou de surpresa as primárias do GOP e as histórias sobre o seu exótico passado e peculiares opiniões fizeram furor nos media.
Mas nada fazia prever uma resposta tão suculenta. O primeiro anúncio, de apresentação, tenta desvalorizar alguma dessas opiniões e imagem negativa, mas é de tal modo desastrado que entra directamente para o historial dos piores anúncios alguma vez lançados:
"Não sou uma bruxa"? Isto é ouro para comediantes. E, claro está, o Saturday Night Live aproveitou imediatamente:
Assim como o seu oponente, o Democrata Chris Coons, com este anuncio:
Ratos com cérebro humano? Quantos candidatos podem usar isso num anúncio de ataque? Coons é um homem de sorte...
Jeff Perry, candidato Republicano ao Congresso pelo Massachussetts, tinha uma hipótese decente de ganhar o lugar (à semelhança de Scott Brown). No entanto, o seu rival Bill Keating desenterrou uma história antiga, que nem sequer o envolve directamente, e a uma semana da votação, a vítima decidiu agora falar. Só vem demonstrar mais uma vez a importância, nestas corridas, de uma boa pesquisa de todos os podres escondidos de um candidato. Pode sempre desenterrar-se algo que decida definitivamente a corrida. E a combinação Abuso sexual/adolescente é particularmente letal.
Claro que tudo culmina num anúncio de ataque devastador:
Ao que este tenta responder, mas de forma bastante fraquinha:
Duas pérolas de Dan Fanelli, candidato às primárias Republicanas para o Congresso pela Flórida (entretanto derrotado), à volta do tema do "racial profiling", que este apoia.
Apesar de obviamente racista, o efeito é de tal forma hilariante, que quase compensa o disparate:
Um anúncio do grupo CAGW (Citizens Against Government Waste) usa o receio da futura hegemonia da China, muito popular entre o eleitorado mais conservador, para atacar os programas da Reforma da Saúde, estímulo à economia e a "nacionalização" das grandes empresas (leia-se regulação). Apesar do seu pressuposto ridículo, está muito bem feito, com uma produção e cinematografia acima da média, e usa de forma muito eficaz as ansiedades sobre o futuro para fazer passar a mensagem.
Dois exemplos de anúncios que procuram usar a questão da imigração ilegal para atacar os seus oponentes, e qualquer politica que conduza a uma legalização dos milhares de trabalhadores hispânicos que entram nos EUA, utilizando deliberadamente o racismo. O que é de salientar é o uso dos estereótipos e do medo do "hispânico marginal" para persuadir o eleitorado (supõe-se) anglo-saxónico.
O primeiro, da Republicana Sharron Angle, que concorre para o Senado pelo Nevada:
Repare-se no belo efeito do contraste entre os "escuros" e assustadores hispânicos, sempre acompanhados da palavra "ilegais" em vermelho vivo, que vêm tirar os lugares aos universitários, todos brancos, tudo com o apoio incondicional de Harry Reid.
O segundo, bem pior, de David Vitter, também Republicano, que concorre pelo Louisiana:
A mesma cena dos ilegais assustadores a romperem a vedação, para serem mimados pelo seu oponente. Este é quase demasiado mau para ser verdade. Notem o pormenor do "Beinvenidos a los USA". E os polícias com ar impotente (para prender os "marginais", suponho). Uma sucessão de "dog whistles" ao eleitorado mais conservador.
O novo anuncio de Jack Conway, Democrata candidato ao Senado pelo Kentucky, atacando as convicções religiosas do seu oponente, Rand Paul:
E a resposta, ainda em tom religioso. Notem sobretudo o argumento final:
Apesar do tom indecoroso e baixo do anúncio de ataque, há algo que deve chamar ainda mais a atenção: é quase impossível, em muitos estados, ganhar uma eleição sem se ser cristão. Hoje em dia, não é já uma questão de ser vantajoso. É uma questão de ser obrigatório.
Uma das vítimas do movimento Tea-party foi a Senadora Republicana do Alaska, Lisa Murkowski, que perdeu as primárias do seu partido contra Joe Miller, apoiado também por Palin. Inconformada com a derrota, resolveu concorrer como independente através de um método unicamente praticado nos EUA: o "write-in candidate", onde se pede aos eleitores para escreverem o nome do candidato no boletim de voto, e este é considerado válido. Desde que o nome esteja bem escrito.
O que coloca uma questão prática: apesar de ser bem conhecida no estado, o seu ultimo nome é muito difícil de escrever. Pelo que lançou esta série de anúncios "didácticos", destinados precisamente a isso: aprendam a escrever o meu nome!
Um das mais curiosas peculiariedades da politica americana são os "blue dogs", os Democratas eleitos em zonas conservadoras do país. Estão à direita do Partido Democrata, mas não chegam a ser Republicanos, e têm de assumir posições de tal maneira antagónicas com o seu partido que ocasionam algumas das mais espantosas contorsões politicas a que podemos assistir.
É o caso deste espantoso anúncio, onde o candidato Democrata ao congresso pela Georgia, Jim Marshall, se gaba de votar maioritáriamente com os Republicanos, de não apoiar a sua própria líder, e de rejeitar as politicas do seu partido. E notem a curiosa referência aos Hippies de S. Francisco logo no início.
Uma explicação mais detalhada sobre os Blue Dogs (e os seus equivalentes Republicanos) pode ser lida aqui.
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